Preço “promocional” em aplicativo engana consumidores em postos de combustíveis

Postos de combustíveis estão adotando práticas que forçam o consumidor a baixar um aplicativo para ter acesso ao preço normal. Muitos motoristas são informados com o abastecimento já em curso

Você entra no posto que tem o álcool anunciado por R$ 3,59 o litro, enche o tanque e descobre que a conta considerou um valor bem acima: R$ 4,99 o litro. O que você faz?

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Em vários postos do país essa surpresa está virando rotina e muitos consumidores estão se sentindo lesados, principalmente pela falta de informações. Os postos alegam que o preço anunciado é apenas para quem tem o aplicativo da rede. Alguns motoristas só entendem a “promoção” quando o abastecimento já está em curso. Isso pode?

Anúncio em posto oferece dois preços para o etanol. Preço comum só para quem tem app do posto (foto: Renato Fonseca/ Turboway)

Obrigar o cliente a instalar o aplicativo do posto é uma leitura deturpada de uma lei criada durante o governo Michel Temer que permitiu que os comércios cobrem valores diferentes para diferentes tipos de pagamento. A lei foi criada com a justificativa de ajudar o comerciante a oferecer uma opção mais barata de pagamento para quem usa meios de pagamento sem taxa, como dinheiro e atualmente o Pix.

Veja também: Nossa calculadora te diz se é melhor abastecer com etanol ou gasolina



O problema está, primeiramente, na forma como a oferta é feita. Segundo o Código do Consumidor ela deve ser clara e objetiva. Os postos que adotam essa prática geralmente colocam o preço “promocional” em destaque e os detalhes da oferta em letras pequenas logo abaixo (foto abaixo).

A mesma lei que permite que os comércios tenham valores diferenciados para tipos de pagamento também define que a prática tem que ser informada ao consumidor em local bem visível (veja aqui a lei).

Em alguns postos a placa visível a distância divulga o preço, mas as condições estão em letras pequenas (foto: Renato Fonseca/ Turboway)

Outro ponto é que o preço do combustível sem o tal desconto é muito alto em relação ao que é praticado pelos postos que não adotam esta prática. Aí já há infração ao artigo 39 do Código do Consumidor, que diz que o fornecedor não pode elevar sem justa causa e de forma abusiva o preço.

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Afinal temos que considerar que se o posto está informando que há desconto no preço com aplicativo, o preço real é o valor sem o desconto. Ou em uma leitura mais simples: o preço promocional é na verdade o preço real que é praticado sob a condição do comprador deixar seus dados no estabelecimento.

Turboway encontrou na zona sul de São Paulo postos vizinhos com preços muito diferentes. Em um, onde não há promoção para aplicativo, a gasolina custava R$ 4,95 (litro) e no posto com apelo ao aplicativo o produto era oferecido a R$ 6,80 (litro). Porém o preço com aplicativo o litro é oferecido por R$ 4,97. Dois centavos de diferença entre os postos, mas só para quem resolve deixar seus dados no aplicativo.

O preço “promocional” é o único que está em destaque nos anúncios vistos por Turboway, porém as condições são visíveis apenas quando a pessoa está muito perto da placa. Pior ainda quando a pessoa está de carro.

Isso causa também distorções no preço. Na primeira semana de maio a Agência Nacional do Petróleo (ANP) identificou postos vendendo a gasolina a R$ 8,59 em São Paulo. E isso aconteceu justamente em postos que adotam a prática que estamos falando neste texto.

O que fazer?

Se você se sentir lesado pode registrar o caso no Procon, documentando com a nota fiscal do abastecimento (se tiver abastecido) ou com foto do anúncio do estabelecimento. Comunicar os órgãos competentes é útil para que a fiscalização atue e a prática não se torne comum.

Não é proibido oferecer serviços e descontos em aplicativos, mas tudo deve ser feito de maneira clara. O consumidor também não pode ser coagido a fornecer seus dados em troca de descontos. A pergunta que pouca gente faz neste caso é: o que as empresas fazem com os dados de quem baixa e se cadastra no aplicativo?

Cashback?

Outro problema relatado por motoristas é que o tal desconto é fornecido no formato “cashback”. Ou seja, a diferença é creditada em uma futura compra. Assim o consumidor que buscou um preço mais barato ficaria dependendo de uma nova compra no estabelecimento.

Pode ser enquadrado como propaganda enganosa, já que as regras deveriam estar bem claras para quem chega ao posto.

No site Reclame Aqui há uma série de reclamações neste sentido. Seja pela falta de informação do posto, seja pela dificuldade de muitos consumidores em entender o sistema de cobrança ou como se instala o aplicativo.

O Código do Consumidor também é claro quando menciona que o consumidor não pode ser ludibriado por conta de sua situação de vulnerabilidade. Um exemplo claro é o consumidor idoso que não tem habilidade para instalar e cadastrar em aplicativos.

*O autor é editor do site Turboway e advogado.

Publicada originalmente em

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