Era 19 de novembro de 1983 quando os jornais traziam a informação do lançamento de um novo carro da Gurgel: um compacto nacional chamado “XEF” e que tinha como slogan “um carro grande na medida certa”.
Grande de fato o XEF não era em nenhum aspecto. Tinha apenas 3 metros de comprimento e levava apenas três pessoas – todas na frente junto com o motorista.
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O XEF era mais uma das criações de João Augusto Conrado do Amaral Gurgel, o audacioso engenheiro dono da marca que previa atingir a produção de 150 unidades mensais do XEF em junho de 1984.
Alma Volkswagen
O jornal OGlobo dizia que a Gurgel divulgava o carro como um citycar para três pessoas com motor 1.6 Volkswagen refrigerado a ar e voltado para executivos e também para famílias que queriam ter um segundo carro. Tirando a parte dos “executivos”, seria a proposta que hoje tem Mobi e Kwid.
Com o XEF a Gurgel queria conquistar um nicho de mercado diferente do que já atuava. O investimento até então era quase todo em utilitários e veículos elétricos. Segundo reportagens da época, em 1983 a fábrica da Gurgel fabricava 125 veículos por mês, sendo que 5 destes eram elétricos.
O XEF chegava em duas versões: álcool e gasolina. Era um tanto esquisitão, como se fosse um carro convencional encurtado, com vidros e lanternas de VW Brasília. Aliás, repare bem na foto que o XEF usava dois para-brisas de Brasília, um na frente e outro atrás.
A revista Quatro Rodas o rotulou como diferente e caro. O preço realmente era o principal pecado do XEF: ele custava o mesmo preço que um esportivo Ford Escort XR3, com o agravante de ter o mesmo motor barulhento da VW Kombi. A Gurgel justificava com a economia e prometia 16 km/l no XEF.
Com esse motor e apenas 800 quilos o carro ainda sofria para render, levando quase 20 segundos para sair de 0 e chegar a 100 km/h. A velocidade máxima era de 138 km/h, marca semelhante ao dos VW da época, mas a anos luz dos concorrentes que atendiam o público mais endinheirado, o nicho que a Gurgel queria atingir.
Na avaliação da época de Quatro Rodas, o carro tinha boa dirigibilidade com bom espaço interno para os ocupantes. Também foi destacado que pelo peso o carro deveria ter um rendimento melhor e o câmbio de quatro marchas o limitava.
O carro foi produzido como todos os outros Gurgéis, colunas de aço envolvidas por uma carroceria de plástico e fibra de vidro. Isso dava vantagem no peso, mas visualmente não trazia o melhor resultado. Por dentro ele é bem simples, tendo o rádio como único “luxo”.
Projeto GTA
Você começou esse texto em 1983, mas o projeto que deu origem ao XEF deu as caras ao mundo pela primeira vez em 1978, no Salão do Automóvel, e era chamado de GTA (Gran Turismo Articulado).
O GTA tinha um jeitão da agora futurista picape Tesla, mas a proposta não era a de uma picape. A proposta era ser um carro pequeno para rodar na cidade com uma carretinha atrás que serviria como um “porta malas” para o caso do motorista querer viajar com o veículo.
A ideia da carretinha era mais uma das várias criações da Gurgel, mas essa não foi para frente. O projeto seguiu então sem ela e evoluiu para o XEF, nome que foi registrado pela Gurgel no dia 22 de outubro de 1979.
A história da mudança de nome também foi tratada na revista Quatro Rodas reproduzindo uma informação da própria Gurgel. A filha do dono da empresa teria chegado em casa dirigindo um protótipo e foi perguntada de quem era o veículo. A resposta: – do chefe!
Não apenas era do chefe João Gurgel como ele mesmo queria que o carro fosse voltado para um público executivo, por isso seu design lembrava os traços adotados no passado pela Mercedes. Esbarrou porém na falta de espaço. O XEF levava no máximo uma maleta em sua parte traseira.
Ainda assim o carro foi para a linha de produção e o primeiro a ser produzido em série, com placa HS4323, foi apresentado ao presidente brasileiro João Figueiredo em 19 de dezembro de 1983. Foi o início de uma história que durou apenas 3 anos e terminou por falta de clientes mesmo.
O XEF não decolou
O XEF deixou de ser produzido em 1986 e no ano seguinte a empresa já produzia o BR-800, seu maior sucesso.
O compacto XEF vendeu 145 unidades em três anos (58 a álcool e 87 a gasolina). Talvez porque a Gurgel tenha sonhado com um nicho inexistente ou porque o XEF de fato não era o carro que se propunha.
Hoje ele é considerado um carro raro de ser encontrado e, segundo o Denatran, existem atualmente 114 Gurgel XEF com registro ativo no Brasil, a maioria (37) é de 1984.
A cidade com mais XEFs emplacados é São Paulo, com 20 deles. Em segundo vem a cidade baiana de Lauro de Freitas, com 7, e depois o Rio de Janeiro, com 5. Os demais estão distribuídos por cerca de 80 cidades pelo país.