Natal de 2020, época concorrida para alugar carro. Mas ele deixa a locadora sediada em São Paulo com um Ford Ka prata, daqueles com cara mesmo de alugado. Junto, aquela sensação de liberdade, de sair por aí dirigindo, curtir a virada de ano e um pouco do verão. A devolução estava marcada para quase um mês depois, 18 de janeiro, uma segunda-feira.
Mas o dia chegou e nada dele aparecer. “Vai ver decidiu esticar o fim de semana”, podem ter pensado os funcionários da locadora, já que muitas são flexíveis na devolução – cobrando bem pelos dias excedentes, é claro.
Veio fevereiro, março, julho, setembro, novembro… Até que dia 1º de dezembro de 2021 o Kazinho quebrou. Problema no motor, longe de ser simples. Pra piorar, quem aciona seguro de um carro que está sumido?
Sem guincho, sem visita ao mecânico e sem uma ideia melhor do seu ‘dono’, ele foi abandonado ali mesmo, em um posto de combustíveis na beira da BR423 em Águas Belas/PE, a 2.343 quilômetros de casa. Era um fim pouco digno para o hatch. Mas a história não ia terminar assim.
Foram policiais rodoviários que desconfiaram do Ka estacionado por três dias no mesmo lugar e ligaram os pontos. Ao puxar a placa, descobriram que havia o boletim de ocorrência feito em São Paulo pela locadora. Não foi difícil achar o locatário, já que ele era conhecido dos funcionários do posto. Foi preso e responde pelo crime de apropriação indébita.
Quem acha a história acima incomum, vai se surpreender. De um ano para cá, só a Polícia Rodoviária Federal recuperou mais de 200 veículos com queixa de apropriação indébita, de norte a sul do Brasil. Todos os casos eram de locatários que não devolveram o veículo no prazo, e circulavam por aí como se fossem os donos.
Em fevereiro do ano passado, um motorista se preparava para deixar o Brasil com uma Renegade branca alugada. Foi parado e preso em Miranda/MS, a caminho da fronteira com a Bolívia.
Em outro caso, um homem foi preso no Paraná usando um Onix Plus alugado para contrabandear cigarros. Além de não devolver o veículo no prazo, ele ainda retirou os bancos dos passageiros para carregar uma maior quantidade de produtos.
O caso mais recente foi nesta terça-feira (11). No início da madrugada, durante uma ronda de rotina, policiais recuperaram um Renault Kwid com queixa de apropriação indébita na Rodovia Fernão Dias, em Atibaia. O motorista, que era reincidente no crime, foi preso.
Vale lembrar que, pelo Código Penal, apropriação indébita tem o mesmo peso do furto. Os dois crimes têm como pena reclusão de um a quatro anos, além de pagamento de multa. As locadoras podem ainda cobrar pelas diárias excedentes. O motorista que alugou e abandonou o Ford Ka ficou devendo 317 diárias. E um motor novo.
Ele deve um carro novo
Nem todo mundo é pego pela polícia, mas não escapa de ser processado pela locadora. Um motorista de Araraquara/SP sumiu com um Chevrolet Onix Joy e nunca mais atendeu às tentativas de contato, que foram insistentes.
Mas como ele deixou todos os dados na assinatura do contrato, não foi difícil para a empresa o acionar na justiça. Ela pede o bloqueio do documento do carro, além, é claro, a reintegração de posse. O juiz do caso já concedeu a tutela antecipada.
A justiça ainda vai avaliar outro pedido da locadora, que não abre mão das 669 diárias que deixaram de ser pagas. Como cada uma custou, em contrato, R$ 84, o fujão já deve R$ 56 mil em diárias, mais que o próprio carro, avaliado em R$ 50 mil na tabela Fipe.