Doc da BBC mostra a ascensão e queda de Carlos Ghosn, ex-executivo da Nissan

Obra da BBC conta como Carlos Ghosn cresceu dentro da Nissan e como fugiu do Japão, onde responde por crimes contra a administração da montadora. Leia a resenha.

Estreou ontem no canal britânico BBC o documentário “The Last Flight”, que conta como foi a fuga do Japão do executivo brasileiro, ex-presidente da Nissan, Carlos Ghosn. Carlos cumpria prisão domiciliar no país quando fugiu escondido dentro de uma caixa de instrumentos musicais. Carlos hoje vive no Líbano.

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Turboway assistiu o documentário, que ainda não está disponível no Brasil, e abaixo trazemos uma resenha. “The Last Flight” tem apenas um episódio de 1 hora e 40 minutos e foi produzido pelo canal BBC Four.

Desde o começo

O documentário conta toda a trajetória de Ghosn a partir do final dos anos 90, quando era um executivo da Renault. Posteriormente ele foi assumindo cargos estratégicos na Nissan sem abandonar o posto na empresa francesa. Acontece que Nissan e Renault formaram uma aliança ao trocarem participações acionárias entre si, o que não chega a caracterizar uma fusão.

O doc é contado na maior parte do tempo com a narrativa do próprio Carlos, que deu uma longa entrevista à BBC para esta produção. Como manda o bom jornalismo, a BBC também entrevista outros personagens, como o correspondente do The New York Times no Japão e outros ex-executivos de Nissan e Renault, que classificam Carlos como um executivo fora de qualquer padrão, no bom e no mau sentido.



O documentário traz um enredo muito bem pontuado sobre a trajetória de Carlos como executivo até sua vida atual como fugitivo da justiça japonesa. Porém falta profundidade ao tratar de temas que já foram explorados pela imprensa. Por exemplo, a situação da fuga de Carlos do Japão, que traz como único ineditismo o próprio Carlos contando a história. Os fatos, no entanto, já eram conhecidos.

Herói ou vilão?

A trajetória de Carlos na Nissan é controversa, mas fato é que o material visual disponível no doc mostra que a presença de Carlos nas fábricas e eventos da montadora era sempre transformado em um grande evento.

Por um lado ele se transformou em um herói por salvar a montadora japonesa de uma falência e isso rendeu um status de herói no próprio Japão, onde Ghosn chegou até a virar personagem em história em quadrinhos (por lá um mangá). Por outro lado, a salvação financeira da Nissan passa pelo corte de vários postos de trabalho e benefícios generosos que a empresa tinha no Japão e que são vistos como uma afronta à cultura japonesa.

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Aí começam a se multiplicar os desafetos de Carlos: sindicato, setores do governo e executivos que perderam o poder nesta mudança. E essa é a narrativa que Carlos quer que você acredite: uma grande conspiração para sacá-lo do poder e arruinar sua carreira. Pessoas que destacam as características positivas de Ghosn também ponderam neste ponto: o exibicionismo exagerado de Carlos pode ter sido a gota d’água que irritou os japoneses.

Um ex-promotor japonês diz à BBC que todo o discurso de Carlos é balela, que há provas suficientes que ele sonegou 5 bilhões de ienes em 5 anos, o que corresponde a R$ 167 milhões. Carlos contesta e diz que a denúncia é fantasiosa e que chegou a ser ameaçado para confessar os crimes na prisão.

Trecho do documentário mostra Carlos cumprimentando funcionários japoneses nos anos 2000 (Foto: Reprodução/ BBC)

O material da BBC é quase todo produzido em cima de imagens subjetivas e fica mais interessante em seus últimos 20 minutos, onde o executivo relata como, durante sua prisão domiciliar, fugiu do Japão com destino à Beirute. O doc mostra imagens do aeroporto de Tóquio, na chegada de dois ex-militares, um americano e outro libanês, que planejaram e executaram o plano de fuga.

O plano foi Carlos fugir em uma caixa de instrumentos musicais, que segundo ele foi escolhida porque naquele momento havia muitos shows acontecendo no Japão, o que não levantaria suspeitas. No dia da fuga Carlos teve um dia normal. Acordou, fez sua caminhada matinal, tudo para não levantar suspeitas dos japoneses. A roupa usada na fuga também contribuiu: tênis e camiseta, anormal para o executivo sempre visto de terno em público.

O plano começa com Carlos pegando um trem-bala para Osaka. Ali ele entra dentro de uma caixa de instrumentos em um hotel, que é transportada até o aeroporto da cidade. Lá a caixa é despachada em um jatinho particular com destino ao Líbano. Carlos calcula que ficou durante uma hora e meia dentro da caixa. O Líbano não tem acordo de extradição para o Japão, o que o favorece.

Deixados para trás

Um plano de sucesso, para Carlos. Mas ao final o documentário traz as consequências para quem ajudou o executivo nos últimos anos. Seu assistente, Greg Kelly, permanece no Japão e foi condenado a 15 anos de prisão. Os americanos Michael Taylor e seu filho, que foram as pessoas que colocaram Carlos na caixa e se responsabilizaram pelo transporte dos “instrumentos musicais”, foram presos nos Estados Unidos e entregues à justiça japonesa.

Sobre essas pessoas, Carlos se manifestou da seguinte forma: “Só Deus sabe quais serão os resultados deste caso baseado, como eu disse, em mentiras. Sinto pena de todas as pessoas que são reféns do sistema de justiça do Japão”.

A Nissan informou à BBC que fez uma investigação interna e que concluiu que Carlos e Greg Kelly tiveram condutas nocivas e violaram o código de ética da empresa. Um painel da ONU condenou a prisão de Ghosn, considerada arbitrária. O governo japonês refutou isso.

Carlos Ghosn deu entrevista à rede britânica BBC (Foto: Reprodução/ BBC)

Quem é Carlos Ghosn?

Carlos Ghosn é brasileiro, nasceu em Porto Velho, Rondônia, e foi com a família para o Líbano aos seis anos. Com nacionalidades brasileira, francesa e libanesa, ele ficou conhecido nos anos 2000 por salvar a montadora japonesa Nissan da falência. Em 2018 ele foi preso pelo escândalo fiscal envolvendo a montadora Nissan.

Atualmente o ex-executivo trava uma batalha para provar sua inocência na justiça japonesa. Ao mesmo tempo tenta reconstruir sua imagem e vem concedendo entrevistas sobre o assunto. Carlos sustenta que sua condução à frente da Nissan, que levou a uma junção com a Renault, desagradou os japoneses. Entre os feitos de Carlos à frente da Nissan está o plano de eletrificação da linha da empresa, que resultou no projeto do Nissan Leaf, hoje vendido no Brasil.

Publicada originalmente em

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