Na prática, um carro de R$ 140 mil vai acabar custando R$ 115 mil ao consumidor final.
A Câmara dos Deputados aprovou esta semana a Medida Provisória que aumenta o teto de isenção de impostos para carro PCD, uma antiga e insistente reivindicação das montadoras, que viam na medida uma maneira de impulsionar as vendas, cada vez mais caras – e não por causa dos impostos.
Mas em um país que falsifica atestado médico para vacinas e também para deficiências, será esta uma sobrevida ao mercado?
Em vez dos R$ 70 mil como limite de isenção – que atualmente abarcava apenas modelos mais básicos – os deputados dobraram a meta e agora permitem que carros com preço de até R$ 140 mil entrem na lista de isenção. É mais do que os R$ 100 mil pedidos pelas montadoras até pouco tempo atrás, que havia sido negado na MP original, de autoria do executivo.
Na MP original, além de não aumentar o limite, o governo ainda aumentou de dois para quatro anos o período mínimo de permanência do cliente PCD com o carro, algo parecido com um decreto do governo de SP, de outubro do ano passado.
Com a intervenção dos deputados, na prática, um carro de R$ 140 mil vai acabar custando R$ 115 mil para o consumidor. Para as montadoras nada muda no que ela recebe por veículo, já que a diferença de R$ 25 mil será absorvida pelos governos federal e estadual, que não receberão o valor de impostos, entre eles IPI e ICMS. Mas para as fabricantes o aumento no volume de vendas criará um ambiente de lucratividade.
Não é de hoje a discussão pelo aumento do valor limite, criado há 12 anos. Nesse tempo, o carro encareceu e as pessoas com deficiência se viram cada vez com menos possibilidades de adquirir um carro por um preço mais justo. Era momento, sim, para um reajuste que corrigisse a defasagem de preços e se fizesse cumprir a principal premissa da lei: garantir a inclusão.
Por outro lado, o que se viu nos últimos anos foi uma espécie de farra no mercado. Pessoas que não tinham direito acabaram comprando aos montes modelos com isenção de impostos, gerando uma renúncia fiscal além do esperado – sem falar no aspecto moral.
Se em 2009, foram 25 mil emplacamentos para o público PCD, em 2019 houve um grande salto para 215 mil unidades. Há dois anos, de tudo que era vendido no mercado, 8% eram modelos PCD. Segundo dados do IBGE, o Brasil tem hoje 25% de pessoas com algum tipo de deficiência, mas sabemos que a maioria esmagadora não tem condições de adquirir um carro, infelizmente.
Olhando a distorção dos números, o Ministério da Economia optou por não atualizar mais a lei, deixando o mercado naturalmente esfriar. Isso até a atuação da Câmara esta semana.
A medida é provisória
O relator da MP 1034/21, o deputado Moses Rodrigues (MDB/CE) incluiu no texto o novo valor, além de um novo grupo com direito à isenção, os deficientes auditivos. Ele também reduziu de 4 para 3 anos o período de permanência com o veículo, que veio no texto original. A validade da MP vai até 31 de dezembro de 2021 e ainda precisa passar pelo Senado e também por sanção presidencial para virar lei em definitivo.
Na prática, as montadoras contornam um problema criado, em parte, por elas mesmas. Para se manterem bem lucrativas em um ambiente de dólar alto, elas subiram bastante os preços de um ano para cá, criando uma escalada de remarcações que beira o surreal.
Se não houver endurecimento contra as fraudes, os espertinhos vão conseguir pagar o que eles pagavam antes da hiperinflação do mercado. Em outras palavras, quem arcará com a diferença serão os cofres públicos, por meio da renúncia fiscal. Sendo mais direto ao ponto, o contribuinte em geral.
No meio de tudo isso está o cidadão com deficiência que tem direito garantido por lei e nada tem a ver com quem pratica as fraudes.